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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Na saúde e na doença, Amor

Georges (Jean Louis Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva)

DILVO RODRIGUES*

Causou estranheza a Hollywood o anúncio do diretor austríaco Michael Haneke ao revelar que iria produzir um filme sobre um dos sentimentos humanos mais nobres. Não se imaginava, é provável, que Amor (Amour, 2012) viria a concorrer às estatuetas do Oscar 2013 em cinco categorias (Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Roteiro Original, Melhor Filme de Língua Estrangeira). 

Pois bem, Amor não é apenas mais uma história de amor. Aos que ainda não viram o filme, explico: o drama, uma coautoria entre França, Alemanha e Áustria, conta a história de Georges e Anne, um casal de aposentados, que vivem a dura fase da decadência do corpo e da mente, ao mesmo tempo em que o som dos sinos titilantes daquele amor de juventude parece distante, quase inaudível. 

Anne, personagem interpretada magnificamente pela atriz francesa Emmanuelle Riva, foi professora de música clássica, mas ainda é apaixonada pela arte. Paixão compartilhada pelo marido, Georges, interpretado pelo também francês Jean Louis Trintignant. Eles vivem de forma tranquila em um espaçoso apartamento na bela Paris. A rotina de Georges e Anne, entretanto, é totalmente alterada quando a ex-professora sofre um derrame. Georges assume então a via crucis dos cuidados médicos para com a esposa.

 

Vários filmes sobre velhice já foram feitos, outros inúmeros sobre amor. Mas, tratar dos dois assuntos de maneira tão direta não é algo costumeiro nas telonas. E, aqui, arrisco a colocar no mesmo balaio tanto o mainstream hollywoodiano como o cinema independente, autoral, underground etc. 

A questão é que Haneke escolhe outros caminhos de narrativa e de linguagem cinematográfica. Lança mão de planos longos, que dão um ritmo bastante peculiar à sequência - o que pode provocar certa impaciência aos menos adaptados ao cinema conceitual (vide A Árvore da Vida, 2011), já que a chegada do momento derradeiro de Anne é demorado, sofrido. A câmera é fixa e mantém certo distanciamento dos personagens dentro da cena. Há acontecimentos que ocorrem fora do ângulo de visão da câmera. Os personagens se perdem em diálogos que são secundários à trama. Posso dizer que todas essas "escolhas" foram felizes, já que, com o filme, Haneke faturou sua segunda Palma de Ouro no último Festival de Cannes.
 
Mas, convenhamos, grande parte da atmosfera reflexiva, trágica, depressiva de
Amor está sobre os ombros dos atores. Eles dão, de sobra, conta do recado. Na pele de Anne, Emmanuelle Riva transmite a cada espasmo uma discordância com seu trágico destino. Era como se dissesse a Georges: “Prefiro morrer a continuar assim.” Sem dúvida que essa mensagem era recorrente nos pensamentos dele, desencadeando questões como: “Eu a amo tanto, como posso suportar o seu sofrimento?”. Talvez, seja uma questão como essa a causa do clímax, fazendo com que até um dos sentimentos mais nobres da natureza humana assuma no filme uma faceta cruel. Mas ainda assim, é amor.

Ficha: Amor (Amour)> Drama, Áustria/França/Alemanha, 2012. Duração: 127 minutos. 


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Imagem: http://on.fb.me/VnCMSY 

*Dilvo Rodrigues, 28 anos, é um jornalista mineiro que estuda Cinema e vive em Curitiba. Quando uma boa comida e cachaça não ocupam seu paladar, lê sobre Filosofia, toca violão ou fica admirando as obras pós-impressionistas de Van Gogh.

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